Creio que educar é basicamente habilitar as novas gerações no exercício de uma visão não ingênua da realidade, de maneira que seu olhar tenha em conta o mundo, não como uma suposta realidade objetiva em si mesma, mas como o objeto de transformação ao qual o ser humano aplica sua ação. Mario Luiz Rodrigues Cobos - o Silo, "A Paisagem Humana", capítulo 'A Educação'
quarta-feira, janeiro 04, 2006
Raízes e características das desigualdades no Brasil
Nelson Bacic Olic
19/1/2004
A história da humanidade é marcada pelo fenômeno das desigualdades. Na atualidade, as desigualdades sociais ocorrem tanto nos países ricos como nos países pobres. Nos primeiros, temos uma espécie de oceano de prosperidade com algumas ilhas de exclusão social. Já nos países pobres, temos vastos oceanos de pobreza pontilhados de pequenas ilhas de prosperidade. Especialmente nas últimas duas décadas, tanto nas sociedades mais ricas (de forma cada vez mais perceptível), quanto nas mais pobres, está se ampliando o fosso que separa os "incluídos" dos "excluídos".
A tendência à concentração de renda que leva, às desigualdades e exclusão sociais, não é fenômeno recente nem exclusivo do Brasil. Em nosso país, um dos campeões mundiais das desigualdades, a dramática situação de exclusão social da atualidade tem sua origem no processo inicial de estruturação da sociedade brasileira.
Assim, desde o período colonial e durante a época do Brasil imperial, o monopólio da terra por uma elite de latifundiários e a base escravista do trabalho, foram os fundamentos que deram origem a uma rígida estratificação de classes sociais. O fim da escravatura, da qual o Brasil foi o último país a se livrar, não aboliu o monopólio da terra, fonte de poder econômico e principal meio de produção até as primeiras décadas do século XX. O abismo social entre o enorme número de trabalhadores e a diminuta elite de grandes proprietários rurais delineou as bases da atual concentração de renda do país.
O Brasil passou por grandes transformações ao longo do século XX. Sua economia tornou-se cada vez menos agrária, a indústria passou gradativamente a ser a atividade econômica mais dinâmica, a população cresceu e rapidamente se urbanizou, a sociedade tornou-se mais complexa, mas a concentração da renda não só persistiu, como se aprofundou, pois a grande maioria da população permaneceu à margem do mercado consumidor de bens duráveis..
Todavia com a crise do modelo de substituição das importações, na década de 1980 e o seu colapso, seguido da aplicação de doutrinas neoliberais na década seguinte, não só levaram a ampliação das desigualdades sociais, como também permitiram compreender melhor que, à medida que a sociedade incorpora novas realidades, criam-se novas necessidades (o acesso à educação, ao trabalho, à renda, à moradia, à informação etc) que vão além da simples subsistência.
Essas transformações mais recentes fizeram por cristalizar dois “tipos” de exclusão social, um “antigo” e outro “recente”. O primeiro refere-se à exclusão que afeta segmentos sociais que historicamente sempre estiveram excluídos. O segundo atinge aqueles que, em algum momento da vida, já estiveram socialmente incluídos.
No Brasil as desigualdades analisadas pelo ângulo da concentração de renda indicam que o rendimento dos 10% mais ricos da população é cerca de vinte vezes maior que o rendimento médio dos 40% mais pobres. Mais ainda: o total da renda dos 50% mais pobres é inferior ao total da renda do 1% mais rico. Esses dados comprovam que o crescimento econômico brasileiro desenvolveu-se sob o signo da concentração de renda. As grandes desigualdades sociais também se manifestam nas unidades regionais do país
Mapeando a exclusão socialRecentemente, um grupo formado por cientistas sociais publicou um trabalho intitulado Atlas da exclusão social.Usando como base metodologia similar à adotada pela ONU na confecção do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), chegou-se a um outro índice denominado Índice de Exclusão Social.
Esse índice foi construído com base na combinação de três componentes: o padrão de vida digno (com indicadores de pobreza, emprego formal e desigualdade), o conhecimento (anos de estudo e alfabetização) e risco juvenil (concentração de jovens e índice de violência)..
Calculados para todos os municípios do país, esses índices foram também cartografados. Um dos mapas, o de manchas extremas de exclusão social, mostra de imediato que as áreas de extrema exclusão social concentram-se em municípios localizados nas regiões Norte e Nordeste "transbordando" para norte de Minas Gerais e nordeste de Goiás.
Nessas áreas, de maneira geral, verifica-se uma exclusão de tipo “antigo”, fato comprovado pelas dificuldades de acesso à educação, à alimentação, ao mercado de trabalho e outros mecanismos de geração de emprego e renda.
Nas regiões Sul e Sudeste, embora sejam poucos os municípios com índices extremos de exclusão social, sabe-se que suas realidades sociais internas, principalmente nos mais populosos, são de grandes desigualdades.. Esses municípios apresentam um contingente cada vez maior de pessoas que, apesar de escolarizadas, de já terem trabalhado em empregos formais e fazerem parte de famílias pouco numerosas, vivem uma situação de desemprego e de renda insuficiente.
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