quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Haitianos repudiam fraudes e exigem Préval na Presidência

O comandante das tropas das Nações Unidas no Haiti, general José Elito Siqueira, afirmou que as manifestações da população haitiana em favor do candidato vitorioso René Préval “têm sido pacíficas e não podem ser evitadas”

O candidato presidencial do partido A Esperança, René Préval, vitorioso por larga margem nas eleições ocorridas no último dia 7 de fevereiro denunciou “fraudes maciças e erros grosseiros que denigrem o processo eleitoral”, horas antes da descoberta de pilhas de votos, a maioria seus, no meio de um lixão perto da capital. René conclamou o povo do Haiti a manter a mobilização contra o resultado, ainda que parcial, divulgado pelo Conselho Eleitoral Provisório (CEP) e apoiou o movimento da população “em defesa de seus direitos, mas mantendo a ordem. Não devemos permitir que se aproveitem da nossa justa revolta para nos prejudicar”. No momento em que multidões já ocupavam as ruas condenando as fraudes e exigindo que a declaração da vitória de Préval, Pierre Richard Duchemin, representante da Conferência Episcopal da Igreja Católica e integrante do CEP, declarou que “sem dúvida, houve uma manobra insana com os dados do resultado eleitoral”.

O comandante das tropas militares da ONU, general brasileiro José Elito Sique-ira, afirmou que as manifestações dos haitianos em favor do candidato favorito René Préval não podem ser evitadas. “Essas reações não são desejadas, mas não podem ser evitadas, porque houve atraso na divulgação dos resultados”, afirmou em entrevista à Radiobrás na terça-feira, 14. “As manifestações foram pacíficas e não resultaram em nenhum incidente grave em todo o país”, acrescentou o general Siqueira referindo-se às manifestações da segunda, dia 13.

FRAUDE EXPLODE NA TV

Apesar das evidências de roubo escancarado mostradas pela TV local Telemax e da elevada e suspeita - para as condições do Haiti, com voto não obrigatório - ocorrência de cerca de 5% de votos brancos, Condoleezza Rice, secretária de Estado de Bush pediu que “se respeitem os resultados das eleições”, ou seja, pediu que a população se conforme diante de tantas evidências do roubo, manobrando para não reconhecer a derrota da agressão de Bush ao país e apostando num segundo turno em 19 de março. A atitude de Leslie Manigat, candidato sustentado pelos EUA, de manter a candidatura depois de obter menos de 12% dos votos, também revela qual a direção em que os ianques estão jogando.

Enquanto isso, em nome do governo brasileiro, Marco Aurélio Garcia, assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, defendeu o reconhecimento da vitória de René Preval e que ele seja declarado presidente do Haiti. “Propomos que os outros candidatos reconheçam sua derrota e a vitória de Préval”, afirmou Marco Aurélio Garcia, acrescentando que esta “seria a melhor solução” levando em conta “o clima existente no país”. Ele reiterou a proposta por um acordo político “pelo qual os demais candidatos reconheçam a vitória de Preval”. “Agora, evidentemente, isso é uma coisa que não podemos impor, isso é um problema que só os haitianos podem resolver”, declarou. O assessor da Presidência disse que esta proposta tem a “unanimidade da comunidade internacional”, manifestando que o Brasil rejeita “uma deterioração da situação” naquele país. Marco Aurélio Garcia advertiu que pode “haver uma comoção popular” caso se protele o reconhecimento da vitória de Preval. O embaixador brasileiro no Haiti, Paulo Cordeiro de Andrade Pinto, constatou que a proposta brasileira de declarar o candidato René Préval vencedor foi “muito bem recebida” no Haiti. Para o embaixador Andrade Pinto, um dos fatos suspeitos é o elevado número de votos brancos, quase 5% do total. “É um número muito elevado e isso não é comum aqui no Haiti”, enfatizou.

Depois do golpe perpetrado contra o presidente Aristide, no início de 2004, o governo Bush nomeou um certo Gerard Latortue como “primeiro-ministro”, preposto que morava em Boca Raton, na Flórida e há muitos anos não botava os pés no Haiti. Latortue adiou o quanto pôde as eleições, mesmo depois de ter formado uma Comissão Eleitoral que, apesar da presença de alguns representantes de intituições do país, colocou as decisões sobre a preparação da eleição nas mãos dos americanos. “A Comissão foi composta por técnicos norte-americanos e alguns outros estrangeiros que escolheram os locais de votação e controlaram as eleições, mantendo o trabalho deles sob total sigilo”, conforme denunciou Anselme Remy, ex-presidente do Conselho Eleitoral Nacional. Mesmo assim não houve com evitar a acachapante derrota.

“GANHAMOS NO 1º TURNO”

“Não estamos de acordo com as cifras que são divulgadas neste momento. Eu digo ao povo haitiano e ao mundo que estamos seguros de ter ganho no primeiro turno e vamos demonstrar isso às autoridades eleitorais”, declarou René Préval, ex-primeiro-ministro do governo de Jean Bertrand Aristide, em coletiva de imprensa, realizada em sua residência de Porto Príncipe, na terça-feira, dia 14. Com uma esmagadora preferência no eleitorado mais humilde - mais de 80% da população do país vive na pobreza - reconhecida até pelos seus adversários, os primeiros resultados dados a conhecer mostravam que Préval tinha obtido mais de 61% dos votos. Porém, passaram os dias e o CEP, infestado por funcionários a serviço de interesses antinacionais e enrolado em contas turvas e inexplicáveis, anunciou no domingo, dia 12, à noite, que o percentual tinha diminuído para 49%. Sem acordo entre os próprios funcionários da organização, a página do CEP na web divulgava 52% a favor de Préval.

Beirando o ridículo, o candidato sustentado pelos EUA, Leslie Manigat, que tirou mesmo nessa apuração fraudada só 11,83% dos votos, com 90,02% das urnas já apuradas e o empresário Charles Baker, um dos poucos brancos no Haiti, é o lanterninha da disputa.

SUSANA SANTOS

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