quarta-feira, julho 02, 2008

O impacto da crise dos EUA no Brasil: como enfrentar

O impacto da crise dos EUA no Brasil: como enfrentar–1

NILSON ARAÚJO DE SOUZA*

Depois de iniciada, no segundo semestre de 2007, a crise financeira nos EUA, detonada pela implosão da bolha do mercado hipoteco-imobiliária, deflagrou-se, a nível internacional, o debate sobre seu impacto nos chamados países emergentes, dentre eles o Brasil. Um momento importante desse debate ocorreu por ocasião do Fórum Econômico Mundial, realizado em Davos, na Suíça, em janeiro de 2008.

Três posições vêm sendo postuladas a partir de então. A primeira “tese” é a de que haveria um “descolamento” da economia dos países emergentes em relação às turbulências na economia estadunidense. Nessa visão, esses países sofreriam um impacto pequeno à medida em que estão mais preparados para enfrentar crises internacionais. Isto porque contariam com grandes volumes de reservas cambiais, um forte superávit na balança comercial; além disso, sua dinâmica econômica interna vem sendo fortemente influenciada pelo crescimento da demanda interna.

Essa posição foi defendida em Davos pelo ex-vice-presidente do Banco Mundial e Prêmio Nobel de Economia, Joseph Stiglitz. Segundo ele, “o Brasil é um dos poucos países que terá um pouco mais de facilidade para atravessar a tempestade” (Cit. In Dantas, Fernando. “Brasil é visto com otimismo e cautela”. O Estado de S.Paulo, 24.01.2008, p. B5).

Aqui no Brasil, ela é representada principalmente pelos principais membros da equipe econômica, sobretudo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Ainda que tenham se concentrado na questão brasileira, é possível situá-los entre aqueles que vêm postulando o “descolamento” do conjunto dos países emergentes, já que os principais deles se encontram em situação semelhante à do Brasil.

Segundo Meirelles, “Hoje em dia, vivemos num regime de câmbio flutuante, não mais de câmbio fixo, e temos reservas (em moeda forte) muito elevadas. Esta combinação de fatores positivos na área externa é extremamente vigorosa. Hoje, o saldo das contas externas brasileiras deixa claro que, mesmo numa situação de catástrofe internacional, teremos uma capacidade de resistência muito longa, suficiente para que o câmbio flutuante possa fazer os ajustes necessários sem pânico. Além disso, houve um ajuste interno. Hoje, temos a dívida pública líquida total que representa um percentual cadente do PIB. Temos também um Banco Central que tem dado provas sistemáticas de seu compromisso com o regime de metas inflacionárias. É isso que faz com que a economia esteja estabilizada. Pela primeira vez no Brasil estamos colhendo o que chamo de ‘os dividendos da estabilidade’. Durante muitos anos, só tivemos o custo da estabilização, mas a estabilidade nunca chegava” (Meirelles, Henrique. Entrevista à revista Época, 11.02.2008).

A segunda “tese” postula que, ao contrário, os países emergentes serão afetados pela crise. Em Davos, um dos principais defensores dessa posição foi o ex-secretário do Tesouro dos EUA, Lawrence Summers: “O Brasil está numa posição muito melhor do que quando tivemos dificuldades econômicas no passado, mas acho que qualquer um que confie totalmente na tese do descolamento está fazendo uma aposta arriscada” (Cit. in Dantas, cit.). 

“DESCOLAMENTO”

No Brasil, entre os que defendem essa posição está o ex-diretor do Banco Central, Alkimar Moura. Diz ele: “não existe descolamento no mercado. A queda nas Bolsas reflete isso. Se o problema americano for suave, aí estamos relativamente protegidos. Se for maior, tem efeitos diretos e indiretos como queda nas exportações” (Apud Sciarretta, Toni. “Economistas colocam em xeque tese de ‘descola-mento’”. Folha de S.Paulo, 19.01.2008, p. B5).

Posição semelhante, ainda que por razões diferentes, é defendida pelo atual representante brasileiro na diretoria do FMI, Paulo Nogueira Batista Jr. Segundo ele, “ninguém imagina, é claro, que o nosso país ficará imune à crise, especialmente se ela for longa e profunda” (Batista Jr., Paulo Nogueira. “Reforçar as defesas externas”. Folha de S.Paulo, 31.01.2008, p. B2).

O impacto, segundo Moura, se refletiria, sobretudo, na queda das exportações; já Batista Jr. concentra sua análise nos “pontos de vulnerabilidade”, expressos, principalmente, no significativo volume de recursos especulativos dentro do país.

A terceira “tese” defende a posição de que, ao contrário do “deslocamento”, o que estaria havendo seria o “recolamento”. Na sua formulação original, em lugar de serem afetados pela crise nos EUA, os países emergentes é que iriam puxar as grandes economias. Foi apresentada em nível internacional pelo Banco Mundial, para o qual o forte crescimento econômico dos países emergentes poderia impedir uma maior desaceleração da economia mundial (Bird. “Perspectivas econômicas globais 2008”).

Essa posição foi defendida no Brasil pelo ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros. Usando, figurativamente, a “teoria dos dominós” e partindo da constatação de que os países emergentes (liderados pela China) vêm contribuindo com um percentual maior no crescimento mundial e tendem a aumentar esse diferencial em 2008, conclui Barros que a economia dos emergentes poderia ajudar a alavancar a economia mundial (Barros, Luiz Carlos Mendonça de. “Papel crepom ou aço?”. Folha de São Paulo, 08.02.2008, p. B2).

Consideramos que, contraditoriamente, cada uma dessas postulações tem alguma coisa de verdade. Mesmo que tenham sido formuladas para analisar o impacto da crise estadunidense no conjunto dos países em desenvolvimento, elas têm sido aplicadas ao caso brasileiro. Para examinar essa situação, consideremos dois cenários: um de curto prazo e outro de médio/longo prazo. No cenário de curto prazo, devemos examinar o impacto da turbulência financeira deflagrada nos EUA sobre a situação financeira do país; no médio/longo prazo, examina-se o impacto tanto da turbulência financeira quanto da desaceleração (dela derivada) da economia estadunidense sobre a balança comercial e a atividade econômica no Brasil.

Comecemos pelo primeiro cenário. Consideramos corretas as alegações de que o Brasil está mais imune ao impacto de crises financeiras internacionais. Três fatores possibilitam ao país defender-se melhor de uma eventual contaminação financeira da crise externa, a saber:

a) a existência de um elevado volume de reservas cambiais que, em 20 de fevereiro de 2008, atingiu o montante de US$ 188,2 bilhões (Fonte: BCB. Disponível em: www.bcb.gov.br. Acesso em: 21.02.2008);

b) a existência de um saldo positivo na balança comercial que, no período 2005-07, esteve, em média, em torno de US$ 43 bilhões anuais (Ibid.);

c) o fato de que, em janeiro de 2008, conforme anúncio do BC, o país se tornou um credor líquido externo, já que as reservas internacionais – que são aplicadas no exterior - superaram a dívida externa em US$ 4 bilhões (Ibid.).

Essa contaminação poderia provir de duas fontes: a) os gestores dos grandes bancos e fundos financeiros internacionais poderiam, para fazer em face de prejuízos sofridos com a desvalorização de seus ativos financeiros (US$ 5,2 trilhões apenas no mês de janeiro de 2008), tentar retirar recursos aplicados em países em desenvolvimento, como o Brasil, provocando uma fuga de capitais e de reservas e, em conseqüência, uma desvalorização descontrolada das nossas moedas; b) esses mesmos gestores poderiam, igualmente, realizar ataques especulativos a determinados países em desenvolvimento, retirando deles seus capitais, a fim de forçar seus bancos centrais a elevar as taxas de juros.

TURBULÊNCIA

No Brasil, desde que a crise estadunidense inaugurou-se no segundo semestre de 2007, tem havido uma ou outra turbulência na bolsa de valores (com destaque para o mês de janeiro de 2008, quando houve uma queda de 6,88% ao longo do mês - Cf. “Bolsa de SP deve reabrir com queda”. Folha de S.Paulo, 06.02.2008, p. B1 -, mas, no dia 20 de fevereiro, a bolsa já havia recuperado essa perda, enquanto o Dow Jones dos EUA permanecia com uma perda de 12% no ano), mas, até agora, não se registrou qualquer fuga de capitais. Ao contrário, nossas reservas aumentaram nesse período: entre o fim de outubro de 2007, quando a situação se agravou a nível mundial, e o fim de janeiro de 2008, nossas reservas cresceram quase US$ 20 bilhões, de US$ 167,8 bilhões para US$ 187,5 bilhões (Fonte: BCB. Disponível em: www.bcb.gov.br. Acesso em: 19.02.2008). No mês de janeiro, apesar de ter havido uma certa fuga de capital estrangeiro da bolsa de valores (R$ 4,85 bilhões. Cf. “Bolsa de SP...”), as reservas aumentaram em US$ 7,2 bilhões (fonte: BCB), revelando que, mesmo tendo saído da bolsa, os capitais não se evadiram do país. 

Mas, isso não significa que estejamos imunes a um eventual ataque especulativo ou à saída de capitais para cobrir prejuízos dos bancos e fundos nos países centrais. Só significa que o país está com mais “bala na agulha” para enfrentar uma situação como essa. Segundo Meirelles, “hoje, o saldo das contas externas brasileiras deixa claro que, mesmo numa situação de catástrofe internacional, teremos uma capacidade de resistência muito longa, suficiente para que o câmbio flutuante possa fazer os ajustes necessários sem pânico” (Cf. revista Época, cit.).

O presidente do BC tem razão ao afirmar que, “mesmo numa situação de catástrofe internacional, teremos uma capacidade de resistência muito longa”. O problema é que, para ele, o “ajuste” será promovido pelo “câmbio flutuante”, ou seja, pela ação dos especuladores internacionais sobre o comportamento da nossa taxa de câmbio. Ora, se houver uma fuga em massa de capitais, poderá haver uma rápida, forte e atabalhoada desvalorização do real. É óbvio que o real está muito valorizado e começa a prejudicar as exportações e a acelerar as importações, mas em nada ajuda a economia brasileira uma desvalorização muito rápida, forte e atabalhoada, pois isso poderia trazer a inflação de volta. Além disso, a tendência do próprio Meirelles, num quadro como esse, seria voltar a elevar a taxa de juros e o superávit primário para desestimular a saída de capitais e tentar bloquear o retorno da inflação. Esse tipo de “ajuste” significaria, na prática, torpedear o processo em curso de retomada do crescimento da economia.

E possibilidade de uma fuga em massa de capitais existe, ainda que não seja a tendência principal. Há um fato que tem sido pouco divulgado e que foi trazido à baila pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr. no artigo anteriormente citado. Diz ele o seguinte: “em dezembro último, a dívida externa de curto prazo por vencimento residual chegou a US$ 64 bilhões. O estoque de investimentos de portfólio de não-residentes (basicamente ações e títulos de renda fixa) alcançou US$ 204 bilhões. O passivo externo de curto totalizava, portanto, algo como US$ 270 bilhões em fins de 2007” (Batista Jr, op cit.).

Ou seja, ainda que, em termos de dívida externa, como assinalamos anteriormente, o país seja credor líquido, a situação financeira externa do país não está equacionada, pois existe muito mais capital especulativo de não-residentes dentro do país do que reservas cambiais (US$ 270 bilhões contra US$ 188 bilhões). Isso significa que uma fuga em massa de capitais poderia fazer evaporar as reservas, como ocorreu em 1998. Diante dessa circunstância, não basta esperar que o câmbio flutuante promova o ajuste. Caso venha a se manifestar essa ameaça de fuga de capitais, o governo teria que estar preparado para bloqueá-la a fim de proteger nossas reservas. Para isso, alguma forma de controle do movimento de capitais especulativos teria que ser implementada. Um dos instrumentos seria a centralização do câmbio no Banco Central. Caberia, também, diversificar a aplicação das reservas no exterior, já que está muita concentrada em títulos dos EUA, ou seja, do país que é o epicentro da crise.

*Economista, professor e membro do Secretariado  Nacional do MR8

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NILSON ARAÚJO DE SOUZA*

No cenário de médio/longo prazo, colocam-se duas questões: 1) se a crise internacional se agravar e vier a ocorrer uma fuga de capitais, que efeito isso teria sobre a atividade econômica interna?; 2) se a forte desaceleração da economia dos EUA se transformar em recessão, que efeito isso teria sobre a balança comercial e a atividade econômica no Brasil?

Com relação ao primeiro caso, depende da reação do governo brasileiro. Se a decisão for a de deixar o câmbio flutuante promover o “ajuste”, coadjuvado por juros e superávits primários elevados, o resultado será a desaceleração da economia, conspirando contra a reativação que ela tem experimentado no período recente, além de reacender a chama inflacionária. Isso porque, como vimos, uma desvalorização descontrolada da moeda poderia pressionar os preços para cima, enquanto os juros elevados e a queda dos investimentos públicos ou a elevação dos tributos (como forma de aumentar o superávit primário), ao retirar dinheiro de circulação, desanimam a atividade produtiva, tanto privada quanto pública.

Como assinala o economista Francisco Eduardo Pires de Souza, membro do Grupo de Conjuntura de UFRJ: “O risco maior ocorreria se a crise afetasse os fluxos de capital para o Brasil de tal modo que levasse o Banco Central a subir os juros” (Cit. In “Impacto da crise é limitado, diz especialista”. Folha de S.Paulo, 18.01.2008, p. B3). No entanto, se, em lugar de deixar o câmbio flutuar livremente e de elevar os juros e o superávit primário, o governo optar por proteger nossas reservas cambiais mediante alguma forma de controle de capitais, os juros e o superávit primário podem ser reduzidos, estimulando, assim, a atividade produtiva.

Quanto ao possível impacto de uma recessão nos EUA sobre a balança comercial e atividade econômica no Brasil, cabe registrar, em primeiro lugar, que, também neste aspecto, a economia brasileira está mais preparada do que nas crises que ocorreram nos anos de 1990. Um aspecto decisivo é o fato de que os EUA já não têm o peso na economia mundial de antes. Segundo cálculos do FMI, com base no PIB medido por Paridade do Poder de Compra, a participação dos EUA na economia mundial, em 2006, era de 19,7%, vindo a China em segundo lugar, com 15,1% (Canzian, Fernando. “Crise pega Brasil e o mundo mais ricos”. Folha de S.Paulo, 27.01.2008, p. B3). Ou seja, já não se pode afirmar que, ao crescer, a economia dos EUA automaticamente alavancaria as demais economias e que, ao declinar, levaria de roldão essas economias.

Além disso, houve mudanças na economia brasileira que a tornaram menos dependente da dinâmica da economia dos EUA. Destacam-se duas a seguir:

- em primeiro lugar, houve uma forte diversificação das nossas exportações. Na década de 1990, por ocasião das turbulências internacionais, a participação dos EUA na pauta de exportação brasileira chegou a superar os 30%; em 2007, não passava de 17% (Fonte: MDIC. Disponível em: www.desenvolvimento.gov.br. Acesso em: 20.02.2008). Se formos considerar por categoria de uso, os EUA participam com 20,44% das nossas exportações de bens de capital (os países da América Latina entram com 40,47%), 11,18% das exportações de bens de consumo (a América Latina, 24,65%) e 14,99% das matérias primas e bens intermediários (atrás da União Européia, da Ásia e da América Latina) (MDIC. “Exportação brasileira – blocos econômicos por categoria de uso”. Disponível em: www.desenvolvimento.gov.br. Acesso em: 20.02.2008).

- apesar da forte contribuição das exportações para o dinamismo recente da economia brasileira, o mercado interno, depois de anos de achatamento, vem evoluindo positivamente desde 2004: o volume de vendas no comércio varejista cresceu 6,2% em 2006 e 9,6% em 2007 (IBGE. “Em 2007, vendas no varejo cresceram 9,9% e a receita nominal, 14,1%”. Disponível em: www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias. Acesso em: 20.02.2008).

Isso significa duas coisas: a) que a economia brasileira, para seguir exportando e se expandindo, depende menos do mercado estadunidense; b) que, graças à expansão do mercado interno, depende menos das exportações do que antes para manter o crescimento.

No entanto, aqui também há alguns elementos de vulnerabilidade:

a) os principais importadores do Brasil  - União Européia, China e América Latina – dependem, em certa medida, de suas exportações para o mercado estadunidense; isso significa que, com a desaceleração econômica ou recessão nos EUA, eles tendem a diminuir suas exportações, contraindo, em conseqüência, suas importações oriundas do Brasil;

b) as importações brasileiras vem crescendo a um ritmo muito superior ao das exportações (em 2007, 32,04% contra 16,58%. Fonte MDIC. Disponível em: www.desenvolvimento.gov.br. Acesso em: 20.02.2008), devido, principalmente, à forte valorização da nossa moeda: o dólar baixou de R$ 3,50 em dezembro de 2002 para R$ 1,80 em dezembro de 2007;

c) esse “desequilíbrio dinâmico” está deteriorando o saldo positivo na balança comercial: caiu de US$ 46 bilhões em 2006 para US$ 40 bilhões em 2007 (Fonte. BCB. Disponível em: www.bcb.gov.br. Acesso em: 20.02.2008); a prosseguir a tendência verificada em 2007, em 2008 esse saldo pode cair para US$ 27 bilhões; esse é o cenário otimista previsto pela Fundação Centro de Comércio Exterior (Rehder, Marcelo. “Exportação menor afeta o PIB”. O Estado de S.Paulo, 05.02.2008, p. B3), mas a FIESP, num cenário menos otimista, em que as exportações só cresceriam 5%, estima um superávit de US$ 24 bilhões (Ibid.); com essa tendência, em algum momento no futuro, poderemos voltar aos déficits comerciais que tantos problemas trouxeram para o país na década de 1990;

d) com a queda do superávit comercial, o próprio BCB já estima que, em 2008, o saldo comercial não será suficiente para cobrir o déficit da balança de serviços (juros, lucros, royalties, etc.), voltando o país a ter déficit na balança de transações correntes, fazendo-o voltar a depender da entrada de capitais externos para fechar seu Balanço de Pagamentos;

e) ainda que o dinamismo recente da economia brasileira venha sendo puxado pela expansão do mercado interno, as exportações têm um peso importante na nossa economia: representaram em 2007 de 12% a 15% do PIB, a depender da forma de medição deste; caso se concretize a estimativa da FIESP para o crescimento das exportações em 2008 (5% contra os 16% de 2007), isso significaria, segundo a entidade, uma perda de 2 pontos percentuais na expansão do PIB (Rehder, Marcelo. “Exportação menor afeta o PIB”. O Estado de S.Paulo, 05.02.2008, p. B3).

f) depois de quatro anos de saldos positivos na balança comercial de produtos manufaturados, o ano de 2007 assinalou o retorno do déficit nessa balança (ver tabela abaixo); assim, o superávit comercial que temos obtido depende da balança de produtos básicos (as chamadas “commodities”), cuja perfomance decorre não tanto do aumento da quantidade exportada, mas da melhoria dos preços internacionais, de modo que nosso saldo positivo na balança comercial está na dependência de um fator (preços dos produtos básicos) altamente sujeito a perturbações no mercado internacional.

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Isso significa que uma eventual queda das exportações, derivada da contração da economia estadunidense, poderá afetar a nossa balança comercial, aumentando as perspectivas de queda do superávit comercial, e repercutir negativamente, ainda que em grau menor, na atividade econômica interna, à medida que, vendendo menos no exterior, as empresas passariam a produzir menos. Isso não significaria necessariamente a queda da produção interna, isto é, um processo recessivo, mas se poderia perder, a depender da dimensão da retração das exportações, alguns pontos na taxa de crescimento do PIB, comprometendo a meta de crescimento de 5% ao ano lançada pelo Programa de Aceleração de Crescimento. 

Para enfrentar essas vulnerabilidades, o país deveria – como fez em 1930 e em 1974 – aproveitar a crise para transformar sua economia de modo a aumentar seu “grau de endogeneidade”, isto é, de forma a fazer sua dinâmica depender cada vez mais de fatores internos, que estão sob controle nacional. Nesse sentido, cabe registrar a importância do Programa de Aceleração do Crescimento como instrumento destinado a incrementar a infra-estrutura física (transporte e energia) e social (saneamento básico e habitação) do País, mas torna-se necessária adoção de medidas de política industrial que favoreçam o avanço da industrialização. Urge, portanto, concluir a discussão que está sendo feita dentro do governo sobre uma política industrial, discussão que, de alguma forma, foi retardada em face da rejeição da CPMF pelo Senado Federal. A formulação dessa política terá que levar em consideração os possíveis impactos da crise internacional sobre a economia brasileira.   

Assim, para compensar eventuais problemas que podem afetar nossas exportações e dessa forma prejudicar a atividade econômica, seria recomendável criar mecanismos para dinamizar mais ainda o mercado interno, tais como a aceleração da recuperação do salário mínimo, a derrubada da taxa de juros e a redução do superávit primário (como forma de injetar mais dinheiro em circulação).

Por outro lado, para contornar a deterioração da balança comercial, um caminho seria adotar ações que pudessem conter o forte crescimento das importações. Isso implicaria em selecionar os produtos que estão pressionando a balança comercial e adotar mecanismos que estimulassem sua produção interna, tais como elevar suas alíquotas de importação e conceder-lhes isenções fiscais e créditos baratos pelo BNDES. Não descartar investimentos públicos nessa área.

Um estudo dos dois últimos anos (2006 e 2007) da nossa balança comercial indica que produtos são esses: matérias primas e produtos intermediários para a indústria farmacêutica; partes e peças para bens de capital para a indústria e para automóveis, aviões, navios, etc.; acessórios de equipamentos de transporte; maquinaria industrial; matérias primas para a agropecuária; máquinas e aparelhos de escritórios e serviço científico; veículos automóveis de passageiros; produtos alimentícios, produtos farmacêuticos.

O país já possui capacidade produtiva para muitos desses produtos. No entanto, a indústria local sofre a concorrência predatória dos produtos que vêm de fora, favorecidos pelo real valorizado e pelos juros elevados dentro do país. Para outros produtos, teria que instalar essa capacidade produtiva. Teria que se estudar cada caso e verificar o instrumento mais adequado. Seria o PAC da Indústria, assim como já foi feito o PAC da Educação e outros PACs.

*Economista, professor e membro do Secretariado Nacional do Movimento Revolucionário Oito de Outubro - MR8

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