Multinacional espanhola embolsará mais alguns milhões às custas do contribuinte paulista para continuar fornecendo a impopular banda lenta
Na quarta-feira da semana passada, a Telefónica anunciou que ia lançar a “banda larga popular”. Era algo tão ridículo – nem a banda larga dos ricos funciona na Telefónica – que resolvemos não fazer comentários. Para que estragar uma piada tão perfeita?
Pois, 24 horas depois, o governador de São Paulo, José Serra, decretou isenção de ICMS para a Telefónica vender a “banda larga popular” aos incautos. O secretário da Fazenda anunciou que se tratava de um programa do governo de São Paulo, mas que a única operadora que havia aderido a ele era a Telefónica. Provavelmente, tal se deu porque o “programa” era da Telefónica. O governo de São Paulo é que aderiu a ele...
A Net lançou nota, declarando que desconhecia a banda larga do Serra e o presidente da Oi disse a mesma coisa. A isenção, portanto, equivalente a 1/5 do que o Estado arrecada com impostos sobre a Internet, foi só para a Telefónica. Os paulistas, que adoram a competência, honestidade e dedicação à causa pública dessa tele, vão ficar muito satisfeitos – e certamente votarão em massa no candidato da Telefónica.
Aliás, muito interessante o decreto do governador de São Paulo: a isenção é para a Telefónica fornecer banda larga com “velocidade mínima de 200 Kbps e máxima de 1 Mbps”. Como? De 200 Kbps a 1 Mbps? Uma faixa que varia em cinco vezes a velocidade? Que velocidade a Telefónica vai fornecer aos usuários? Um renomado especialista que nós consultamos, ilustrou o decreto de Serra com uma panificadora metáfora: “se algum decreto determinar que as padarias possam vender de 5 a 25 pães pelo mesmo preço, certamente que nenhum padeiro irá vender mais do que 5 por esse preço”.
Porém, com a Telefónica, a coisa é pior, pois ela fornece em média 10% da velocidade que consta em seus contratos. Portanto, com muita boa vontade, a “banda larga popular” da Telefónica vai ao ar com 200 Kbps. Se for seguida a rotina dos 10%, o coitado que cair nessa pode se preparar para se suicidar ou para matar algum diretor da Telefónica. E que não se diga que estamos pregando a violência: o que estamos pregando é que ninguém compre essa joça. Assim, estaremos livres de consequências mais trágicas.
A ONU, através da União Internacional de Telecomunicações (UIT), define que a banda larga deve ter “capacidade de transmissão mais rápida que a velocidade primária da rede digital de serviços integrados (ISDN) em 1,5 ou 2,0 megabits por segundo (Mbits)” (Recomendação I.113, “Vocabulary of terms for broadband aspects of ISDN”, do Setor de Normatização da UIT). A “velocidade primária” referida nessa definição vai de 16 a 64 kbit por segundo (Recomendação I.430 da UIT). A banda larga, portanto, teria que ter velocidade 1,5 a 2 Mbps acima disso.
Entretanto, a banda larga que o povo merece, segundo Serra, difere pouco de um acesso discado – a diferença são as panes da Telefónica. A essa banda lenta vagabunda eles chamam de “banda larga popular”.
No entanto, a vigarice não deixa de ter efeitos pedagógicos. Na semana passada, as teles, o ministro Hélio Costa e mais alguns lobistas, fizeram carga contra o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), que está sendo finalizado no Ministério do Planejamento, sob a coordenação do engenheiro Rogério Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da Informação.
Segundo esses cavalheiros, era um absurdo afastar as teles da universalização da banda larga, apesar delas até agora não terem universalizado nada, pelo contrário. O PNBL prevê a participação de inúmeras empresas privadas não-monopolistas – mas, exatamente para que seja possível a participação dessas empresas (e, de resto, para que seja possível a universalização da Internet via banda larga) o plano não depende do monopólio das teles, cuja ação é sempre a de concentrar seus onerosos serviços numa estreita faixa da população, naturalmente, a mais rica.
Pois bem, depois da banda vadia com isenção fiscal da Telefónica, vai ser difícil alguém defender que as teles é que devem universalizar a banda larga. Aliás, difícil, não: sem dúvida, vão reaparecer esses defensores, pois lobismo e burrice não são muito afetados pela realidade. Difícil é eles serem levados a sério. A Telefónica e o Serra se encarregaram de avacalhar a causa.
Quanto a Serra, ele concedeu isenção para algo que já existe, o surrado “Speedy light” da Telefónica. A “banda larga popular” é apenas uma mudança de nome. Portanto, tudo continua exatamente na mesma, exceto que a Telefónica embolsará mais alguns milhões às custas do contribuinte paulista.
CARLOS LOPES
Após 5 anos, jornalismo investigativo da Folha conclui que Net é da Telmex/AT&T
Em sua matéria sobre a isenção de ICMS para a Telefónica, a “Folha de S. Paulo” relata que “na hora em que Serra anunciava o teor do decreto, o vice-presidente da Net, Eduardo Aspesi, pedia à sua equipe, por telefone, que descobrisse uma forma de baixar o preço, porque a Telmex (controladora da empresa) iria pressioná-lo após o anúncio da Telefônica”.
Há anos, denunciamos que a Net havia sido desnacionalizada – vendida, contra a lei, à Telmex/AT&T. Cinco anos depois, o perspicaz jornalismo investigativo da “Folha” chegou lá. Entende-se: a “Folha” sempre foi um pouco retardada. E continua escondendo o principal: que o controle da Telmex sobre a Net é completamente ilegal. A “Folha” passa como algo natural, corriqueiro e até banal o que é, rigorosamente, um crime.
Relembremos os fatos.
Em 2004, afogada pelas dívidas, a Globo vendeu a Net à Telmex.
No entanto, a Telmex é uma empresa estrangeira e a lei do cabo (lei 8.977/95) não permite que estrangeiros ou companhias estrangeiras tenham mais do que 49% do capital votante das operadoras de TV a cabo.
Sendo assim, a Telmex e a Globo decidiram burlar a lei. Para montar a engenharia da ilegalidade, contrataram dois experts, os advogados Barbosa Müssnich e Sérgio Bermudes – notórios por seus serviços para Daniel Dantas no açambarcamento da Brasil Telecom.
Para resumir a operação:
1) A Telmex e a Globo fundaram uma empresa, a GB Empreendimentos e Participações (CNPJ 04.527.900/0001-42), para a qual foram transferidas 51% das ações com direito a voto da Net Serviços.
2) Desses 51% das ações votantes da Net Serviços em mãos da GB, a Globo ficou com 51% delas, isto é, 26,01% (51% de 51%) das ações votantes totais da Net Serviços. A Telmex ficou com 49%, isto é, 24,99% (49% de 51%) do total de ações com direito a voto da Net Serviços.
3) Por fora da GB Empreendimentos e Participações, a Telmex adquiriu 37,5% das ações com direito a voto da Net Serviços.
4) Com as ações que tem através da GB (24,99%) e com as que tem por fora da GB (37,5%), a Telmex passou a controlar 62,49% das ações com direito a voto da Net.
5) Para completar, a Telmex ficou com 100% das ações preferenciais (sem direito a voto).
6) Toda essa transgressão à lei foi aprovada pela Anatel (como sempre...) pelo Ato 48.245, de 06/12/2004).
A ilegalidade já rendeu, inclusive, um processo da TV Bandeirantes contra a Globo. Mas só agora o assunto passou a existir para a “Folha”, ainda que de passagem - e livrando a cara dos fora-da-lei.
C.L.
Telefónica tenta aumentar o seu monopólio com GVT e BrOi apoia
A Telefónica anunciou no dia 7 uma oferta para a compra de pelo menos 51% das ações da GVT. O preço por ação oferecido foi de R$ 48, o que representa cerca de R$ 6,5 bilhões. O leilão seria realizado no dia 19 de novembro próximo. Anteriormente, o grupo francês Vivendi havia ofertado R$ 42 por ação.
A operadora espanhola atua em São Paulo, enquanto a GVT atua na região da antiga BrTelecom, hoje absorvida na BrOi.
No entanto, o presidente da BrOi, Luiz Eduardo Falco, declarou apoio à Telefónica e oposição à entrada da Vivendi no Brasil: “Eles [a Telefónica] conhecem o mercado brasileiro. Sabem quais são as nossas dificuldades. Teria mais receio se tivesse que enfrentar o grupo francês Vivendi. Eles não sabem nada daqui e poderiam promover ações complicadas e abandonar o País, como há exemplos na história. O Brasil é um bicho estranho e precisamos de players que conheçam as nossas regras”.
Em resumo: a entrada da Vivendi provocaria a reestruturação do cartel, hoje formado principalmente pela Telefónica e pela BrOi. Assim, o presidente da última apoia que a Telefónica entre em sua área ao invés da Vivendi. Sem dúvida, não é porque a Telefónica conheça mais o Brasil do que a Vivendi ou que esta seja mais instável em seus negócios do que a primeira, aliás, uma recordista neste quesito. O problema é que o cartel já está acertado, inclusive quanto aos preços e no modo de lidar com a Anatel. A entrada de outro monopólio - e a Vivendi é um dos maiores do mundo - perturbaria esses acertos.
Os acionistas controladores da GVT são Global Village Telecom Holland (15,05%) e o fundo de investimento norte-americano Swarth Investiments (14,98%). Em 30 de junho de 2009, a GVT tinha aproximadamente 2,3 milhões de linhas em serviços, incluindo voz, banda larga, dados e serviços de VoIP.
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