A China chegou à América antes de Colombo? - 4/5/2006
The Economist
Os bravos marinheiros que abriram as fronteiras do mundo com suas grandes viagens de exploração são figuras marcantes na história européia. Colombo encontrou o Novo Mundo em 1492; Dias contornou o Cabo da Boa Esperança em 1488; e Magalhães circunavegou o mundo em 1519. Há, no entanto, um problema na confiante asserção sobre a maestria européia: ela pode não ser verdadeira.
Parece mais provável que o mundo e todos seus continentes tenham sido descobertos por um almirante chinês, Zheng He, cujas frotas rondaram os oceanos de 1405 a 1435. Suas navegações, bem documentadas nos registros históricos chineses, foram descritas em um livro que surgiu na China por volta de 1418: "As maravilhosas visões da Balsa Estrela".
Em Pequim e Londres, foram reveladas novas evidências que fortaleceram a posição favorável ao pioneirismo de Zheng He. É uma cópia de 1763 de um mapa datado de 1418, o qual tem notas que conferem substancialmente com as descrições do livro. "Revolucionará nossa forma de pensar a história do mundo no século XV", diz Gunnar Thompson, estudante de mapas antigos e de navegadores.
O mapa foi mostrado em Pequim e no Museu Marítimo Nacional, de Greenwich. Seis caracteres chineses no canto direito superior do mapa indicam ser um "mapa do mundo integrado". Num canto inferior, uma nota diz que o mapa foi desenhado por Mo Yi Tong, imitando um mapa feito em 1418, que mostrava bárbaros pagando tributos ao imperador Zhu Di, da dinastia Ming. O cartógrafo distingue o que copiou do original e o que ele adicionou.
O mapa foi comprado por cerca de US$ 500 de um pequeno comerciante de Xangai em 2001. O comprador, Liu Gang, é um dos mais eminentes advogados comerciais da China e coleciona mapas e pinturas. Liu diz que ele sabia ser algo importante, mas pensava que podia ser uma falsificação moderna. Mas cinco colecionadores experientes concordaram que o mapa tinha mais de cem anos, por causa da despigmentação e dos traços de insetos sobre o papel de bambu.
Incerto de seu significado, Liu pediu a opinião de vários especialistas em história chinesa antiga, mas nenhum, diz, estava disponível. Então, no outono passado, ele leu 1421: The Year China Discovered the World ("1421: o ano em que a China descobriu o mundo"), de Gavin Menzies, o qual diz que Zheng He circunavegou o mundo, descobrindo a América no caminho. Menzies, que era tripulante de submarino da Marinha britânica e funcionário de banco, é um historiador amador e sua teoria teve pouca aprovação entre profissionais. Mas seu livro virou sucesso de vendas. Seus argumentos convenceram Liu de que seu mapa era uma relíquia das primeiras viagens de Zheng He.
Os detalhes na cópia do mapa são notáveis. Os perfis da África, da Europa e da América podem ser reconhecidos instantaneamente. Mostra o Nilo com duas fontes. A passagem entre norte e oeste parece não ter nenhuma área com gelo. As imprecisões também são evidentes. A Califórnia é mostrada como uma ilha; as ilhas britânicas não aparecem. A distância entre o mar Vermelho e o Mediterrâneo é dez vezes maior do que a verdadeira. A Austrália está no lugar errado (embora os cartógrafos não tenham mais dúvidas de que a Austrália e Nova Zelândia foram descobertas por navegadores chineses séculos antes do capitão Cook).
Os comentários no mapa, que parecem ter sido copiados do original, estão escritos em claros caracteres chineses, que ainda podem ser lidos facilmente. Da costa oeste da América, o mapa diz: "A pele da raça nesta área é preta-vermelha e penas são amarradas ao redor de suas cabeças e cinturas". Dos australianos, assinala: "A pele do aborígine também é preta. Todos estão nus e usam peças de ossos ao redor de suas cinturas".
É a notável precisão, e não os erros, que os críticos da teoria de Menzies deverão usar para questionar a autenticidade do mapa de 1418. Menzies e seus seguidores tendem a estabelecer a cópia de 1763 como representante fiel do original de 1418, o que traria respaldo à tese de que a China descobriu a América por volta de 1421. Análises espectrográficas de massa para datar o mapa estão sendo feitas na Universidade Waikato, na Nova Zelândia. Mesmo se confirmarem a antiguidade do mapa, a análise terá uma importância limitada, já que só determina a data de tintas e papel do copista.
Cinco especialistas em mapas antigos destacaram que o mapa de 1418 compila informações que estavam disponíveis aos poucos em mapas náuticos anteriores da China, que datam desde o século XIII e de Kublai Khan, que não era de forma nenhuma um navegador. Eles crêem na autenticidade da cópia.
O mapa tem boas estimativas de latitude e longitude de grande parte do mundo e vê a Terra redonda. "Os chineses tinham noção de longitude antes de Zheng He", diz Robert Cribbs, da Universidade da California. Eles presumiram que o mundo era redondo. "O formato do mapa é totalmente consistente com o nível de conhecimento que poderíamos supor dos cartógrafos reais chineses, após as viagens de Zhen He", diz Thompson.
E alguns dos erros do mapa de 1418 logo apareceram nos mapas europeus, o mais gritante sendo a Califórnia como uma ilha. Os portugueses têm conhecimento de um mapa de antes de 1420 feito por um cartógrafo chamado Abertin di Virga, que mostrava a África e a América. Como os portugueses não haviam descoberto esses lugares, as fontes mais óbvias da informação parecem ser cópias européias de mapas chineses.
A visão, porém, está longe de ser unanimidade entre os especialistas, com muitos dos críticos mais vorazes sendo da própria China. O jornalista Wang Tai-Peng, em Vancouver, que atesta as navegações chinesas pelo mundo no século XV (ele escreve sobre uma visita de embaixadores chineses a Florença em 1433), tem dúvidas de que os navios de Zheng He tenham chegado à América do Norte. Wang também argumenta que as cartas de navegação de Zheng He eram feitas de uma forma diferente da tradição chinesa de mapas.
A maioria das falsificações é motivada por fins monetários, especialmente com o mercado de mapas em alta. A Biblioteca do Congresso dos EUA pagou recentemente US$ 10 milhões por uma cópia de um mapa-múndi de 1507, do cartógrafo alemão Martin Waldseemüller. Liu, no entanto, diz que não vende. "O mapa faz parte de minha vida", assegura.
As conseqüências da descoberta do mapa poderiam ser consideráveis. Se provar, de fato, ser o primeiro mapa-múndi, a" história da descoberta do Novo Mundo terá de ser reescrita", avalia Menzies. O que isso importa? Mostrar que o mundo foi explorado antes por navegadores chineses em vez de europeus significaria um grande dose de revisionismo histórico. Mas há mais do que história na questão. Não deixaria de ser menos interessante que os chineses, tendo descoberta a real extensão do mundo, não o tenham explorado comercialmente e politicamente. Afinal, a descoberta da América por Colombo levou à exploração e desenvolvimento do continente pelos europeus, algo que 500 anos depois tornou os EUA mais poderosos do que a China nunca foi.
Autor: The Economist
Creio que educar é basicamente habilitar as novas gerações no exercício de uma visão não ingênua da realidade, de maneira que seu olhar tenha em conta o mundo, não como uma suposta realidade objetiva em si mesma, mas como o objeto de transformação ao qual o ser humano aplica sua ação. Mario Luiz Rodrigues Cobos - o Silo, "A Paisagem Humana", capítulo 'A Educação'
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