Paul Krugman
Do The New York Times
A Europa me preocupa. Na realidade me preocupa o mundo todo - não existem refúgios seguros para a tempestade econômica mundial. Mas a situação da Europa me preocupa mais do que a dos Estados Unidos. Que fique bem claro, não vou repetir a reclamação padrão dos Estados Unidos de que os impostos na Europa são muito altos e seus benefícios muito generosos. Os grandes Estados do bem-estar social não são a origens da atual crise européia. De fato, como vou explicar em breve, é um fator atenuante. Atualmente na Europa, o perigo evidente e presente vêm de outra direção: da incapacidade do continente em responder efetivamente à crise financeira.
A política fiscal e monetária da Europa enfrenta uma crise tão severa quanto a dos Estados Unidos, mas está fazendo muito pouco para combatê-la.
Com relação ao aspecto fiscal, a comparação com os Estados Unidos é surpreendente. Muitos economistas, inclusive eu, argumentam que o plano de estímulos do governo Obama é muito pequeno para o tamanho da crise. No entanto, as ações dos Estados Unidos fazem com que as ações da Europa sejam vistas como muito menores. A diferença na política monetária também é alarmante. O Banco Central Europeu antecipou-se muito menos que a Reserva Federal (na realidade, aumentou as taxas em julho passado), e evita qualquer medida forte para o descongelamento dos mercados de crédito.
O único fator que está funcionando a favor da Europa é exatamente aquele pelo qual ela é tão criticada: o tamanho e a generosidade dos seus Estados de bem-estar, que estão reduzindo o impacto da crise econômica.
Isto não é pouco. Na Europa, com os seguros de atenção à saúde garantidos e generosas parcelas de seguro desemprego, até o momento não há tanto sofrimento humano quanto nos Estados Unidos. E esses programas também vão ajudar a conter os gastos durante a crise.
No entanto, os ditos "estabilizadores automáticos" não são substitutos da ação positiva. Por que a Europa não está preparada? Os maus dirigentes fazem parte da história. Os banqueiros europeus, que não foram atingidos pela crise, ainda parecem estranhamente complacentes. Nos Estados Unidos, para ouvirmos qualquer coisa parecida com os disparates proferidos pelo ministro da economia alemão, só mesmo vindo dos republicanos.
Há um problema ainda mais sério: a integração econômica e monetária da Europa está muito adiantada em comparação às suas instituições políticas. A economia de muitos países da Europa está fortemente vinculada, assim como a economia de muitos estados dos Estados Unidos, e a maioria da Europa tem uma moeda em comum. No entanto, diferentemente dos Estados Unidos, a Europa não possui o tipo de instituições em nível continental necessárias para enfrentar uma crise continental.
Essa é uma razão importante para a falta de ação fiscal: não há um Governo único na posição de assumir a responsabilidade pela economia européia, cada Estado membro é responsável pelo acúmulo de dívidas enormes para financiar benefícios destinados a eleitores de outros países. Poderíamos esperar que a política monetária fosse mais enérgica. Afinal, embora não exista um Governo europeu, existe o Banco Central Europeu. No entanto, o BCE não é a Reserva Federal dos Estados Unidos, que pode dar-se o luxo de medidas audazes, pois é apoiada por um governo nacional unitário, que já se mobilizou para compartilhar os riscos da sua audácia e, com certeza, cobrirá as possíveis perdas, caso os esforços por descongelar os mercados financeiros não dão certo. O BCE, que deve se submeter a 16 Governos que freqüentemente entram em conflito, não pode contar com o mesmo nível de respaldo.
A Europa, em outras palavras, está demonstrando ser estruturalmente frágil em tempos de crise. A grande pergunta é o que vai acontecer com as economias européias que há alguns anos prosperaram num ambiente de dinheiro fácil, particularmente com a Espanha.
Durante grande parte da última década, a Espanha foi a Flórida da Europa. A sua economia se manteve em alta graças ao auge da especulação imobiliária. Como na Flórida, o auge transformou-se em contração. A Espanha precisa encontrar novas fontes de renda e emprego para substituir o desemprego na construção. No passado, a Espanha teria procurado melhorar a sua competitividade desvalorizando a moeda. No entanto, agora tem o euro - e a única forma de avançar parece ser um processo de disseminação da redução de salários. Isto teria sido difícil nas melhores épocas; evidentemente será muito doloroso se, como parece ser muito provável, a economia européia no seu conjunto está em depressão e com tendência à deflação nos próximos anos.
Será isso um sinal de que a Europa errou em permitir essa integração tão estreita? Será que a criação do euro, em particular, foi um erro? Talvez.
No entanto, a Europa ainda pode mostrar que os céticos estão errados, se os seus políticos começam a mostrar mais liderança. Será que eles farão isso?
Paul Krugman é economista, professor da Universidade de Princeton e colunista do The New York Times. Ganhou o prêmio Nobel de economia de 2008. Artigo distribuído pelo New York Times News Service.
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